Ele está num ônibus. Sentado, olha através da janela empoeirada. Olhando para tudo, mas vendo só uma coisa ou outra. O fone de ouvido mantém a trilha sonora e os óculos escuros são como um filtro de fotografia.
Uma árvore chama a sua atenção. Madeira que sobrevive na selva de pedra. Ao se aproximar, faz ele olhar para o céu. Uma nuvem interessante, com o formato de um grande dragão branco sobre o fundo azul-cinza. Um prédio mais alto cobre a nuvem. Seus olhos se voltam para os muros. Banners, adesivos, pichações e pinturas em toldos e marquises. Sobra poluição visual, apesar de tudo que tenha sido feito contra isso.
Daí ele vê as pessoas. Transeuntes correndo atrás de seus assuntos, às vezes sem pressa. Uma senhora e uma garota – seria sua filha? – tomando sorvete enquanto caminham carregando sacolas de compras. Um rapaz joga o papel de bala no chão e provoca um franzir de sobrancelhas. Outro empresta um isqueiro para a moça com cigarro na mão. Um terceiro corre da chuva iminente.
Foi quando ele a viu. Sim, aquela por quem vocês já estavam esperando. Os olhos azuis o fitaram e a expressão de ambos ficou tensa. Ele levantou os óculos e o mundo parou. O ronco do motor do ônibus silenciou. Vidas foram trocadas, uma pela a outra num contato a distância entre os círculos de madeira dele e os de safira dela. Tudo se movia lentamente. Tão lentamente que ele achou que nem se movia, até que as safiras sumissem de se campo de visão.
Ele ficou feliz. “Hoje eu encontrei o amor da minha vida”.
Mesmo que eles talvez nunca mais se vissem novamente.