Esse título parece ser estranho para alguém que, como eu, escreve contos. Mas recentemente notei que essa é uma verdade interessante. A partir do momento em que me dediquei mais a criação de histórias, pude perceber como elas passam de uma folha em branco para uma obra completa, com começo, meio e fim.
Estudando meus métodos de criação, vi que não faço histórias. Eu faço personagens – e são estas que contam as suas histórias. É como se eu inventasse uma nova pessoa e, a partir daí, apenas observo sua trajetória. Vejo seus gestos, suas manias, seus vieses e princípios. É ela quem decide como se vestir, como se comportar, como falar e que decisão tomar.
Às vezes, no entanto, me vejo no papel do destino. Quando imagino que duas pessoas devem ficar juntas, crio situações para que elas possam se encontrar. Porém se elas não tiverem a própria vontade, não há nada que eu, destino, possa fazer. Em alguns momentos acontece de duas personagens se juntarem e, por mais que eu saiba que aquilo não vai dar certo, elas resolvem trespassar a própria fortuna.
Quando decido a história, na verdade apenas decido um fato. Um acontecimento que deve se realizar, mas eu não sei quando nem como ele vai se concretizar. Isso fica a cargo das personagens e suas idiossincrasias.
Quando escrevo um conto, é como se estivesse apenas relatando fatos que aconteceram em algum lugar. Como se já tivesse visto aquela cena, como um filme, na minha mente e, às vezes, como se ela estivesse passando naquele exato momento. Eu não crio a história, ela se cria. Limito-me apenas a relatá-la, pois caso contrário ela se perderia no limbo da minha imaginação.
Em certas ocasiões eu mesmo participo como personagem. Tento me disfarçar, para ninguém de fora me reconhecer, mas não tenho certeza do sucesso – pelo menos não do sucesso completo. Realizo minha catarse dentro de histórias, fingindo participar delas e interagir, enquanto as outras personagens me carregam entre suas tramas.
Por isso, muitas vezes, sinto-me com obrigação de escrever. Numa condição não de autor, mas de jornalista ou redator. Conto as histórias que me surgiram; boto palavras bonitas para dizer as coisas do cotidiano. Cada personagem que imagino dita sua história e eu decido, relutantemente parcial, o que o leitor quer saber. E, então, o abstrato se torna concreto, os conceitos se tornam palavras e as histórias se tornam textos. Enfim, descanso a pena, com o alívio de saber que as personagens ganharam asas e que, nem que seja por um instante, puderam existir em outro mundo – o nosso mundo – ou, pelo menos, em outras mentes.