8
maio

Ressaca

   Postado por: George Marques   em Capítulo 6

Leonardo abriu os olhos e logo os fechou, contraindo as pálpebras em razão da dor de cabeça que sentia. Abriu-os novamente e olhou o teto de seu quarto na penumbra criada pela luz do sol filtrada pelas cortinas. Assustou-se ao ouvir um leve suspiro e virou a cabeça vagarosamente para o lado, percebendo a presença estranha. Juliana? A situação se assemelhava muito com a noite anterior, quando acordou com sua amiga ao seu lado. Mas, mesmo com a fraca iluminação, logo percebeu que não era Juliana.

Não reconhecia o rosto e perguntou-se quem seria aquela garota. Moveu sua mão e acariciou levemente uma das bochechas macias dela. Ela é mesmo bonita, pensou consigo. Recolheu rapidamente sua mão ao perceber que ela se movia. A moça abriu os olhos lentamente e abriu um suave sorriso de satisfação ao vê-lo.

— Já acordou? – ela perguntou com a voz ainda falhando.

— Não tenho certeza. – ele respondeu sem tirar os olhos dela.

— Que horas são?

— Deve ser cerca de oito e meia. – Leonardo não tinha nenhum relógio à vista, mas, pela iluminação do sol em seu quarto, conseguia ter uma ideia aproximada do horário.

— Hm… – ela resmungou.

— Quem é você? – ele não conseguiu deixar de perguntar.

— Você não se lembra de nada do que aconteceu ontem mesmo, não é?

— Somente alguns flashes, como se fosse um sonho. Em nenhum deles você aparece.

— Meu nome é Adriane. Espero que agora você não se esqueça. Vou lá embaixo preparar o nosso café-da-manhã.

Ela levantou-se  e se espreguiçou. Leonardo não deixou de notar que ela usava uma de suas camisetas e que, exceto por uma possível roupa de baixo, era a única peça de roupa que ela usava. Ficou intrigado e não resistiu à curiosidade:

— Nós fizemos sexo ontem?

Ela riu e virou-se para ele, respondendo:

— Não. E eu ficaria muito mal se tivéssemos feito e você não se lembrasse. Mas confesso que fiquei surpresa ao perceber que você estava sendo literal quando me pediu para dormir contigo.

Adriane saiu pela porta e Leonardo ainda ficou na cama tentando processar o que acontecia. Ele sentiu certo embrulho no estômago e uma dor de cabeça que não diminuía. Claro que foi por causa da bebida. Acho que exagerei, pensou. Olhou para teto e manteve a posição por um minuto. Tentou lembrar-se da noite anterior, mas foi inútil. Levantou-se e foi até o banheiro para lavar o rosto. A água fria causou um pouco de alívio e ele ficou olhando sua face amassada no espelho antes de secá-la. Desceu as escadas e foi até a cozinha. Sentou-se em uma cadeira enquanto observava a moça em frente a pia, preparando algo.

— Isso é muito esquisito. – comentou Leonardo, estranhando a rouquidão de sua voz.

— O quê? – Adriane perguntou, sem parar o que estava fazendo.

— O fato de uma completa estranha ter dormido comigo e estar na minha casa preparando nossa refeição. Não costumo confiar em alguém a ponto de trazê-lo à minha casa tão facilmente.

— Da próxima vez, tente não beber tanto. Ainda bem que escolheu a pessoa certa para levar para casa.

Ela virou-se e depositou um copo cheio de suco de laranja e uma pequena tigela com pedaços de frutas, além de uma colher, na mesa, próximo a Leonardo. Voltou e pegou a sua parte da refeição.

— Não é o que costumo comer de manhã, mas não é nada mal. – disse Leonardo.

— É bom contra a ressaca, acredite.

Ele não duvidou e começou a comer silenciosamente. Olhava para a tigela, mas pôde sentir o olhar da moça em sua direção. Sentiu-se constrangido, porém não demonstrou e continuou levando os pedaços de frutas à boca. Lembrou-se de quando acordou ao lado dela, confundindo-a com Juliana. Parou de mastigar e esperou um segundo antes de perceber o detalhe que esquecera. Como pude não me lembrar disso? Correu até a porta da sala de estar e a abriu. Viu que o Siena azul ainda estava na garagem, mas não tinha certeza se isso era bom ou ruim. Voltou para o quarto pulando os degraus da escada. Pegou seu telefone celular e tentou ligar para sua amiga enquanto descia novamente, contudo a ligação caíra na caixa postal. Adriane estava chegava ao pé da escada, intrigada.

— O que foi?

— Estou preocupado com minha amiga. Ela estava comigo ontem.

— Ah, você fala da Juliana?

— Você a conhece?

— Sim. Eu mesma a levei para casa ontem. Então, te trouxe de volta para cá com o carro dela, já que ela me pediu para tomar conta de você. Não sei qual dos dois estava pior, mas cada um estava muito preocupado com o outro. Vocês realmente são ótimos amigos.

— Sim, somos mesmo. – Leonardo suspirou aliviado – E você, pelo que parece, é nosso anjo da guarda.

— Talvez eu seja. – ela riu – Realmente, talvez eu seja mesmo.

Eles voltaram para a cozinha a fim de terminarem a refeição matutina. Comiam em silêncio, quando Leonardo percebeu que teria de explicar a presença dela para sua família. Não tinha ideia de como faria isso. Adriane intuiu que ele pensava em algo e perguntou o que era. Ele demorou um pouco, antes de responder:

— Não sei como explicar sua presença para minha mãe e minha irmã quando elas te virem aqui. Logo elas devem acordar.

— Ah, não precisa se preocupar com isso agora. Elas saíram mais cedo e só voltam à noite. Elas não vão me ver aqui.

— Como você sabe disso?

— Tem um bilhete na geladeira.

Leonardo olhou para o refrigerador e viu o pedaço de papel preso à porta por um imã. Sempre disse à sua mãe que esses bilhetes eram ineficientes, pois ele sempre via somente quando era tarde demais, mas nunca surtia efeito, já que ela continuava a usar esse método para deixar recados.

Ao terminarem de comer, os dois foram até a sala e ligaram o televisor. Não era exatamente o que Leonardo tinha em mente para se fazer num domingo, mas, por algum motivo, ele não conseguiu dizer não à moça que lhe fizera um grande favor. Ficou sentado ao lado dela no sofá, com os olhos direcionados para o aparelho, mas o pensamento em outros lugares. Absorto em suas ideias, ele não ouviu a campainha soar. Só percebeu quando Adriane se levantou para atender à porta.

Juliana estranhou ao ver a moça que abria a porta da frente. Logo percebeu que ela usava apenas uma camiseta que era, obviamente, masculina e comprida demais para ela, chegando até a metade da coxa. Acho que me enganei de casa. Será que ainda estou bêbada? Não duvidaria muito disso, pensou Juliana. Tencionou desculpar-se, mas foi interrompida pela garota, que exclamou:

— Juliana!

Juliana ficou intrigada ao perceber que ela sabia seu nome. Tentou se lembrar de onde se conheciam, mas foi em vão. Então, com um olhar mais atento, notou que seu carro estava estacionado na garagem e viu que a moça usava uma das camisetas de Leonardo. Balbuciou alguma coisa, mas não conseguiu dizer nada inteligível. Em seguida, Adriane correu e abriu o portão para que ela entrasse.

— Venha, entre! Fique um pouco com a gente. Vamos fazer alguma coisa juntos.

Sem ter certeza de que seria uma boa ideia, Juliana tentou recusar o convite, mas, antes que pudesse dizer qualquer coisa, Adriane puxou-a pelo braço e a guiou até o interior da casa. Atônita, a visitante olhou para Leonardo sentado no sofá, que logo lhe retribuiu o olhar, enquanto a outra dizia:

— Olhe, Leonardo, quem veio nos visitar. Viu como você não precisava se preocupar? Já que estamos aqui, poderíamos assistir a um filme. Você tem algo interessante aqui, Leo?

Ele ficou surpreso com a forma que ela o chamou. Não entendia como ela conseguia criar intimidade tão facilmente e isto o incomodava. Ficou pensando, mais uma vez, no que acontecera naquela manhã e perguntava a si mesmo se aquilo tudo seria parte de um sonho estranho.

Este texto foi postado quarta-feira, 8 de maio de 2013 às 10:00 e arquivado como Capítulo 6. Você pode acompanhar as respostas a esta postagem no feed RSS 2.0. Você pode, também, deixar um comentário no formulário abaixo.

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