Faltava cerca de vinte minutos para acabar a aula quando Leonardo notou que Juliana estava à porta da sala. Através do vidro, ela fez uma expressão de interrogação e uma mímica como se escrevesse. Leonardo entendeu que ela perguntava se ele já havia assinado a lista de presença, mas isso somente depois de ele conseguir ler nos lábios dela a palavra “lista”. Ele respondeu assentindo com a cabeça e ela então o chamou para já irem embora. Leonardo hesitou, mas percebeu que não havia motivo para ficar até o fim da aula. Arrumou seu material e saiu, acompanhado dos olhares de seus colegas.
— E então, fui discreta dessa vez?
— Sim, mas eu pensei que você iria me esperar no carro.
— Ah, se eu não viesse aqui te buscar eu sei que você fugiria.
Os dois andaram até o estacionamento onde se encontra o veículo. As duas colegas de Juliana chegaram alguns minutos depois. Eles se cumprimentaram e entraram no carro. Tamires lançava um olhar inquisidor para Leonardo que, simplesmente, tentava ignorar, geralmente com sucesso. Ela, vendo que ele nada dizia, resolver expor seus pensamentos.
— Por que você não me ligou?
— E por que eu deveria ter te ligado?
Ela hesitou e, titubeante, desviou-se da pregunta.
— Eu pensei que você me ligaria.
— Isso foi presunção de sua parte, pois eu nunca lhe disse que faria tal coisa. – apesar das palavras pouco corteses, o tom de voz de Leonardo era suave, o que pareceria, talvez, um sinal de arrogância, mas ele apenas estava sendo sincero.
— Por que me trata tão rudemente? – essas palavras fizeram com que ele franzisse as sobrancelhas.
— Eu te trato do mesmo modo como trato qualquer outra pessoa. Não entendi o que lhe disse de tão rude e, de qualquer forma, não fora minha intenção ofendê-la.
Tamires não sabia o que dizer. Não esperava um comentário tão rebuscado que, de forma tão eloquente, se retratasse e, ao mesmo tempo, invalidara sua indagação. Ele era frio e não se intimidava com seus métodos femininos. Era, realmente, diferente de qualquer outro homem que conhecera. E isto lhe chamara ainda mais a atenção.
— Tudo bem, eu te perdoo. Você irá me ligar amanhã?
— Não. – ele não esperou para responder.
— Por que não?
Leonardo lançou-lhe um olhar de “eu preciso mesmo responder?” enquanto suspirava. Ela contraiu o cenho requerendo uma reposta, que não veio. Ele desviou o olhar e passou a observar a paisagem através do vidro do carro.
— Ei, você não vai me responder?
Ele continuou ignorando.
— Agora, sim, você está sendo rude, quer seja sua intenção ou não. Ju, qual é o problema com este cara?
— Ele, simplesmente, não pretende continuar esta argumentação improdutiva.
— Quer dizer que acha que eu estou dizendo bobagens?
— Não, significa que vocês têm opiniões diferentes e nenhum dos dois conseguirá convencer o outro.
Tamires tencionou dizer algo, mas desistiu. Emburrou-se, cruzou os braços e virou para a janela a seu lado. Estava olhando através do vidro, mas não prestava atenção. Pensava na cena que acabara de ocorrer. Nunca lhe tinha acontecido isso antes. Sabia que não era tão bonita o quanto Juliana, mas conseguia sempre ser tratada com carinho, mesmo quando era dispensada. Não entendia como Leonardo podia tratá-la daquela maneira. Deve ser gay, pensou. Fez uma nota mental para perguntar a Juliana em outra oportunidade.
Logo chegaram ao ponto onde elas desceram do veículo. Eles se despediram, mas Tamires sequer olhou pra Leonardo. Sentia-se humilhada e não o perdoaria. Ele, claro, não se importou muito e quase nem chegou a perceber que fora ignorado. Sentou-se ao lado de Juliana que não pôde deixar de comentar o assunto.
— Partindo corações como quem parte um baralho. Não sabia que você podia ser tão malvado, Leo.
— Até parece que eu vou satisfazer as presunções de alguém só para alegrá-la. Não importa que seja homem ou mulher, bonita ou feia – Leonardo notara certo tom de raiva na voz que não esperava.
— Ok, não precisa descontar em mim. Parece que você realmente ficou abalado com o ocorrido. Sua fortaleza não é mais a mesma.
Leonardo permaneceu em silêncio. Juliana esperou ele se acalmar antes de iniciar o assunto que a deixava ansiosa.
— E então, agora pode me contar sobre sua amiga misteriosa?
— Bem, antes eu tenho que lhe contar uma coisa.
— Hm… Mande.
— Preciso dizer que eu sou um hacker.
— Uau! Por essa eu não esperava. Sei que você é um gênio da informática, mas não imaginava que era um pirata de computador. Nesses oito anos que nos conhecemos, já aprendi a me surpreender com você. E, claro, você nunca me decepciona. Quer dizer, então, que você invade computadores e rouba contas de banco?
— Não assim que a coisa funciona. Eu tenho ética, acredito que você saiba disso. Mas talvez, se for necessário, eu faça isso algum dia.
— Entendi. E o que isso tem a ver com a história?
— Bem, isso você irá perceber logo.
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