Jéssica – Parte 2

— Ela sente sua falta também.

Surpreendi-me com o que ela disse. Como ela poderia saber?

— Eu a conheço, sim. – ela esclareceu. Foi por isso que vim até aqui falar contigo. Ela também está sofrendo. Ela sente a falta daquele você que ela conheceu e não daquele que você se tornou. Ela se pergunta por que você mudou tanto. Parece que agora você percebeu.

— Então ela te mandou até aqui?

— Não, ela não sabe disso. Eu vim aqui por conta própria, pois vocês foram feitos um para o outro, eu posso ver isso. Vim aqui para te dizer para você pedir-lhe perdão. Dizer que se arrependeu e que nunca vai mudar novamente. E dizer sinceramente. Vim aqui para lhe fazer perceber isso.

Sem pensar, abracei-a. Agradeci pelo favor que tinha me feito, por me fazer realizar o que havia de errado e que ainda dava tempo de consertar.

Larguei uma nota sobre o balcão e saí dali. Não queria falar com ela por telefone. Queria vê-la. Queria ver seus olhos tornarem-se azuis novamente e ver seu sorriso brilhar. Queria abraçá-la e beijá-la como não fazia há muito tempo. Não conseguia parar de sorrir.

Andei pelas ruas quase escuras sob a luz da lua minguante e de uma ou outra lâmpada de poste que ainda funcionava. Andei por mais de três quilômetros até a casa dela. Passei por catadores de lixo que trabalhavam de madrugada, por jovens fumando baseados nas esquinas, por bares e baladas ainda abertos com música tocando. Cheguei, enfim, à casa dela.

Respirei fundo antes de tocar a campainha. Não sabia o que esperar. Precisei tocar três vezes antes de ver uma luz se acender no andar de cima – já não aguentava de impaciência. A mãe dela atendeu. Perguntou o que eu queria àquela hora da noite.

— Sinto muito por incomodar, mas preciso falar com sua filha.

Ela me olhou de alto a baixo. Não parecia que estava contente em me ver. Podia entendê-la, também não iria gostar se alguém interrompesse meu sono.

— Não sei se ela vai querer falar com você – ela disse, por fim.

— Imagino que não, mas, mesmo assim, preciso mesmo conversar com ela.

Ela ainda pensou um pouco antes de anuir. Bateu a porta com força, demonstrando seu incômodo. Fiquei esperando por um tempo que pareceu uma eternidade, até que ouvi passos descendo a escada e se aproximando da porta. Com um click, esta se abriu.

Ela estava do jeito exato o qual me lembrava. Não consegui conter sorriso. Ela, no entanto, estava com a cara fechada, parecia que iria emitir raios laser pelos olhos. Não podia culpá-la, claro.

— O que você quer afinal? – ela então resolveu perguntar.

— Eu sinto muito. Quero lhe pedir perdão. Fiz tudo errado, te tratei mal, fui possessivo e ciumento. Eu sei – eu olhava bem nos olhos dela, que ainda estavam sem brilho. A verdade é que eu tinha tanto medo de te perder que quis te prender. Eu entendo se você não gostar mais de mim, mas eu preciso lhe pedir desculpas. Sei que isso não resolve e sei que você tem o direito de não acreditar em mim, só que agora vai ser diferente. Vamos voltar a ser como éramos no começo. Vamos voltar ao tempo em que confiávamos um no outro e que sabíamos o que o outro estava pensando só com o olhar. Por favor. Eu sinto sua falta e ainda te amo.

— Eu queria acreditar em você, mas agora é difícil. Já é um pouco tarde, não acha?

— É tarde, sim. Mas não significa que não dê mais tempo. Antes tarde do que nunca. Sinto falta de se sorriso. Não aguento mais ver seus olhos ficarem cinza.

— Cinza?

— Sim, quando você está feliz seus olhos são bem azuis, mas quando está triste eles ficam cinzentos.

— Nunca pensei que reparasse nos meus olhos – ela deu um sorriso de viés, como se tentasse segurar sem sucesso.

— Sempre reparei. Não consigo deixar de vê-los. Assim como seu sorriso. Quase veio um agora, não?

Ela me abraçou. E me beijou. Não sei por quanto tempo, mas pareceu outra eternidade. E quando terminou não pareceu ter sido mais do que um segundo.

— Você estava bebendo rum? – ela me perguntou – pensei que não gostasse.

Continua.

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